Abrindo as cortinas: alguns apontamentos crítico-reflexivos sobre a situação problemática do ensino superior privado no Brasil do século XXI

A questão requer análise cuidadosa por parte de todos que pensam e fazem Educação

Marcos Pereira dos Santos (*)

prof-marcos-pereira webSem dúvida, ter acesso à Educação é um direito social garantido por lei. No entanto, não basta apenas que o cidadão tenha esse direito assegurado. Antes de tudo, faz-se necessário também que a educação escolar ofertada apresente uma qualidade tal que possa contribuir efetivamente para o pleno desenvolvimento e a emancipação social dos educandos.

É fato que toda instituição escolar, seja ela da rede pública ou privada de ensino, tem suas potencialidades e limitações. Algo semelhante pode-se dizer a respeito dos ranços e avanços apresentados por universidades públicas estaduais, centros federais de educação superior e faculdades privadas. Todavia, quando nos referimos especificamente ao desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem em universidades e faculdades particulares, a questão em foco requer atenção especial e uma análise bastante cuidadosa por parte de todos aqueles que pensam e fazem Educação.

Embora muitas instituições privadas de ensino superior busquem ficar, positivamente, em “pé de igualdade” com as universidades públicas em vários aspectos de âmbito técnico-administrativo, metodológico, didático e pedagógico, entendemos que as primeiras ainda estão um tanto quanto longe de conquistar o sucesso, prestígio, reconhecimento e status social por elas tão almejado por inúmeros motivos de ordem política, econômica, ética e cultural.

Basta observar os concursos vestibulares (inclusive agendados) realizados com constante frequência por muitas faculdades particulares, no intuito de chamar a atenção de candidatos que possuem condições financeiras favoráveis para custear seus estudos ou mesmo possibilitar “oportunidade” de estudo àqueles alunos que não obtiveram êxito em exames prestados anteriormente em universidades públicas estaduais e/ou federais. Some-se a isso o baixo nível de exigência das provas de Redação, Língua Estrangeira Moderna e Conhecimentos Gerais, por exemplo, aplicadas aos futuros calouros; de forma que a aprovação dos mesmos nesse “processo seletivo” é (praticamente) unânime. Trata-se, até certo ponto, de uma verdadeira “infantilização” da capacidade intelectual, analítica e crítico- reflexiva dos vestibulandos.

Além desses fatores, podemos citar também a baixa qualidade de muitos cursos de graduação e pós-graduação ofertados, deixando algumas vezes a desejar no que tange à estrutura curricular; à titulação do corpo docente; ao comprometimento de coordenadores de cursos, professores, acadêmicos e demais funcionários; ao engajamento em atividades de pesquisa e extensão; à execução de práticas de estágio curricular supervisionado; ao nível de exigência em avaliações da aprendizagem; à cobrança dos docentes pela assiduidade dos acadêmicos às aulas; ao atendimento técnico-administrativo prestado a docentes e discentes; à oferta de disciplinas on-line; ao fornecimento de orientações didático-metodológicas para a elaboração de trabalhos monográficos de conclusão de curso em nível de graduação e pós-graduação etc.

Estudos realizados por vários pesquisadores em Educação Superior no período de 2008 a 2012 têm confirmado a veracidade dessas assertivas em relação aos problemas identificados no ensino superior brasileiro, público e privado, embora os mesmos ocorram com maior frequência e grau de intensidade no âmbito das universidades e faculdades particulares. Afora isso, pode-se mencionar também a (quase) total desvalorização do trabalho pedagógico do professor no ambiente universitário privado por parte de muitos acadêmicos, levando assim os docentes ao comodismo ou mesmo a graves estados de estresse emocional; o que implica concluir que, nesses casos, o professor fica à mercê da vontade “maquiada” da clientela estudantil universitária, a qual tende considerar o professor como uma espécie de “animador de palco”, “bobo da corte”, e não exatamente como um autêntico educador que tem a função precípua não somente de “transmitir conteúdos”, mas, sobretudo, de ensinar a aprender, isto é, de criar diferentes possibilidades para que os acadêmicos possam adquirir condições de chegar, sozinhos, às verdadeiras fontes de informação e conhecimento que estão à sua disposição tanto na universidade quanto na própria sociedade como um todo.      

Pensar sobre as mazelas existentes na educação superior privada, em específico, implica questionar acerca do tipo de profissional que essas instituições de ensino estão colocando no mercado de trabalho na atualidade. É uma questão extremamente séria e preocupante que carece de urgente atenção por parte de governantes e estudiosos do campo educacional, a fim de que se possa, ainda em tempo hábil, reverter ao máximo possível o quadro deplorável do ensino e da aprendizagem em muitas universidades e faculdades particulares no Brasil do século XXI.

Já tardou demais, pois, para fazer cair por terra pensamentos e práticas correntes entre educadores e educandos onde “se você finge que ensina, eu finjo que aprendo” seja a única resposta aos muitos problemas e ranços existentes principalmente na educação superior privada. É hora de tirar a “máscara”, sair da inércia e encarar a realidade de frente, tendo em vista construir um futuro promissor para as gerações vindouras. O momento é agora. Mãos à obra!

(*) Marcos Pereira dos Santos é doutorando em Educação, linha de pesquisa “Ensino e Aprendizagem”, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG/PR). Escritor, poeta e professor adjunto do Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (CESCAGE), junto a cursos de graduação (bacharelado/licenciatura) e pós-graduação lato sensu, em Ponta Grossa (PR). Endereço eletrônico: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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